BLACK SABBATH | Makila Crowley

BLACK SABBATH • 30/11/2016

BLACK SABBATH . 30/11/2016 . Pedreira Paulo Leminski . Curitiba/PR
Texto: Jonathan Rodrigues Ev
Fotos: Makila Crowley (fotos tiradas durante o show de São Paulo)

 

Quarta-feira, 30 de novembro de 2016, foi o dia que Curitiba recebeu a já histórica turnê de despedida do Black Sabbath. Cerca de 23 mil pessoas compareceram a Pedreira Paulo Leminski, encarando um tempo nublado e frio, que contou com chuva fina em alguns momentos, formando um ambiente que se encaixou muito bem com o som que seria apresentado.

            Antes dos ingleses, a californiana Rival Sons tratou da abertura da noite. Banda formada em 2009, com cinco álbuns de estúdio na bagagem, estão acompanhando o Sabbath durante toda a “The End Tour”. Melhor para o público, que está tendo oportunidade de conferir outra excelente atração em todos os locais que a turnê está passando.

            Enquanto os shows não começavam, os presentes “aguentaram”, rolando nos P.A.s, apenas músicas do AC/DC, da fase Bon Scott, porém, não de todos os discos, o que resultou que algumas devem ter tocado umas cinco vezes, ou mais. Enfim, vai entender o motivo do repertório reduzido.

            Finalmente, próximo das 20h, ecoou pela Pedreira, servindo como intro, o tema “The Good, the Bad and the Ugly”, do clássico western de mesmo nome, também conhecido por esses lados como “Três Homens em Conflito”, servindo de entrada para o Rival Sons, que engenhosamente emendaram na épica trilha a grandiosa “Electric Man”, contendo um daqueles riffs “quebra-tudo”.

            Sem pausa, foram com “Secret”, outro som sensacional, que mostrou bem toda a pegada cheia de energia do grupo. Difícil até destacar um único integrante, pois todos ali soaram muito entrosados na proposta da banda, que, simplificando, executa aquele rock n’ roll com os dois pés no “classic rock com influência direta do blues”, ou seja, baixo e bateria pulsantes, acompanhados por teclados bem colocados, guitarra cheia de riffs e solos cortantes, e claro, um vocalista alcançando notas altíssimas com seus agudos, e até tocando uma pandeireta em momentos estratégicos.

            Após “Secret”, o vocalista Jay Buchanan falou, em português, “muito obrigado”, e continuaram com “Pressure and Time”, essa numa linha bem Led Zeppelin, com quem são constantemente comparados internet afora. Antes de iniciarem “Open My Eyes”, era possível ouvir uma parte da plateia gritando o nome do grupo, com os músicos retribuindo fazendo sinais de agradecimento. E que belo som é “Open My Eyes”, composta por uma melodia mais “viajada”, entrando no potente refrão, reforçado pelos vocais de apoio do tecladista Todd Ögren-Brooks e do baixista Dave Beste. Em outras canções, o guitarrista Scott Holiday também desempenhou a função de backing vocal.

            Em seguida, continuaram com “Fade Out”, que seria a única apresentada pertencente ao álbum mais recente dos caras, “Hollow Bones”, lançado em junho deste ano. Outra que ficou bem interessante ao vivo, onde o baterista Mike Miley fez ótimas viradas, potencializada pelos trabalhos na guitarra de Scott, que fez uso de slide, e do barbudo e climático tecladista Todd Ögren-Brooks. Aliás, que figura é esse Todd, não raro ele levantou e tocou o teclado em pé, e diversas vezes interagiu com a galera, fazendo gestos pedindo para agitarem. Também usou uma pandeireta em algumas músicas, criando um efeito visual bem curioso, tocando o teclado com uma mão e a pandeireta com outra.

            Vale ressaltar que a iluminação utilizada para o grupo foi bem simples, porém eficiente, e que o telão maior no centro do palco não foi ligado. Os dois telões laterais menores apenas exibiram um desenho com dois nativos americanos montados em cavalos, além do nome da banda. Quanto ao som, este estava nítido, porém, como de costume com atrações de abertura, bem baixo, o que com certeza diminuiu parte do “poder de fogo” dos californianos. E verdade seja dita, caso estivesse mais alto, corria o risco de ofuscar um pouco a atração principal.

            Antes de prosseguirem, Jay Buchanan diz algumas palavras em inglês, entre elas que agradece o público pela recepção, e o Black Sabbath pela oportunidade, para então tocarem “Torture”, numa versão incrementada, passando de oito minutos, e cheia de interações de Todd e Jay com os presentes, que em parte respondeu com palmas e coros. Inclusive Jay cantou trechos com “Curitiba, can you hear me?”, ganhando gritos de vez. A propósito, visualmente, Jay lembra um pouco uma mistura do Ozzy jovem com o falecido vocalista do INXS, Michael Hutchence.

            Encerrando em alto nível, “Keep On Swinging”, com Scott executando mais um belo riff. O grupo se retira, sob muitos aplausos, e gritos de “Rival Sons”, após quarenta minutos de muita energia, deixando terreno preparado para os ícones do som pesado. Como de praxe, jogam palhetas e baquetas, Jay joga uma garrafa de água.

            Sem sombra de dúvidas, uma excelente escolha dos organizadores da “The End Tour”, que possivelmente estará merecidamente os fazendo ganhar maior popularidade. Todas as músicas tiveram alguma modificação se comparadas com as versões registradas em estúdio. Definitivamente é possível afirmar que o Rival Sons é uma banda de palco, mantendo viva essa chama de concertos energéticos com improvisações. Que voltem logo para shows completos, visto que além dessa turnê com o Sabbath, estiveram em 2015 em apresentação única no Monsters of Rock de São Paulo.

            Se você conhece alguém (ou é do tipo) que acha que o rock n’ roll está com os dias contados, não deixe de dar uma chance ao Rival Sons. Como o próprio Jay falou em certo momento da noite: “We are Rival Sons and we play rock n’ roll music”. Algumas pessoas poderão simplificá-los e dizer que não passam de “pastiche” de algumas das consagradas bandas da década de 1970, mas lembre-se, muito já foi criado ao longo do tempo, e é inegável o talento e entrosamento desses sujeitos em ação. Além do mais, se for extremo a esse ponto, nada mais que será feito poderá ser digno de apreciação, e esse sem dúvidas não é o melhor caminho a seguir.

            Voltando a noite, mais vinte minutos de AC/DC, e pontualmente às 21h, as luzes se apagam na Pedreira, começando a exibição de uma animação, que mostra um demônio eclodindo de um ovo, em seguida cuspindo fogo numa cidade, para no meio das chamas surgir o logotipo do Black Sabbath, isso ao som de chuva e sinos. Na sequência os músicos adentraram o palco, causando enorme comoção na plateia.

            Ozzy Osbourne aproximou-se do microfone, exibindo um enorme sorriso, e gritou seu tradicional “cuco”. Bastou Tony Iommi fazer o riff inicial de “Black Sabbath” para “colocar o local abaixo” e arrepiar o público. Após o trecho final do som, fica difícil não se impressionar com o que foi visto e ouvido: a enorme massa sonora criada pelo baixo de Geezer Butler, o riff e peso característico (e único, diga-se de passagem) da guitarra de Iommi, a bateria certeira comandada por Tommy Clufetos, e claro, a figura de Ozzy no palco, que de certa forma criou algum contraste com todo o clima sombrio, visto seu sorriso e interação com público. E isso foi apenas “o começo do fim”.

            Sem deixar tempo para a galera recuperar o fôlego, mais um clássico emblemático, “Fairies Wear Boots”. Aliás, é desnecessário dizer que o repertório foi constituído apenas de clássicos, músicas que ajudaram a dar forma a todo um estilo e modo de se fazer música, e até mesmo de vivenciá-la. Nela, o madman até chegou a dar umas “corridinhas” no palco, e pediu palmas, sendo prontamente atendido, enquanto o telão do centro exibia os integrantes, com a filmagem recebendo algum filtro psicodélico, encaixando com a letra da canção.

            A propósito, o show inteiro foi focado na performance da música, e não tantos em outros quesitos de “espetáculo”, tanto que a iluminação era relativamente simples, e os efeitos e animações nos telões não foram utilizados em abundância, servindo mesmo como complemento para a vibe criada pelo som. Merece menção também os amplificadores do Geezer, decorados com a mascote do grupo e crucifixos.

            A intro no teclado anunciou “After Forever”, uma das grandes surpresas desta turnê, já que não esteve presente na turnê anterior. E que levada conduzida por Geezer e Clufetos, excelente. “Into the Void” seria a próxima, onde não faltaram os “saltinhos” e palmas do Ozzy, que pediu para o público agitar. Nessa os telões alternaram entre filmagens em preto e branco e animações com o oceano. E como ficou pesada ao vivo, provavelmente contou com uma segunda guitarra.

            Prosseguindo, Ozzy falou, em inglês, que a próxima canção é sobre cocaína, se referindo a “Snowblind”. Mais uns gritos de “cuco”, para então Iommi conduzir o riff inicial. Pessoalmente um dos grandes momentos da noite, conferir um lado mais melódico do Sabbath, como nos belos solos de Iommi harmonizando com o teclado. Não faltou participação do público, com coros de “oh oh oh” e mãos levantadas, mexendo de um lado para o outro.

            Após os aplausos, Ozzy apresenta a banda, e aí viria o momento bizarrice do show: o primeiro a ser apresentado é Adam Wakeman, que não toca no palco (?!). No momento de ser apresentado ele foi para o palco, onde Ozzy falou que ele toca teclado e guitarra. Ele acena, e se retira, com Ozzy prosseguindo apresentando os demais integrantes, falando duas vezes o nome de cada um, começando por Geezer, seguindo por Clufetos, e encerrando com Iommi, que ele se referiu como “the only one, mr. Tony Iommi”, sendo o mais ovacionado.

            O “quinto elemento” mostrou que os momentos com teclado não eram pré-gravados, e que definitivamente alguns trechos mais pesados continham mesmo duas guitarras. O mais curioso é que assim como o baterista Tommy Clufetos, Wakeman também é membro da banda solo de Ozzy, e lá ele se apresenta em um local visível pelo público. Bem estranho no Sabbath ele ficar oculto, e mais ainda ser chamado para receber aplausos da plateia. Se o baterista fosse o Bill Ward até faria sentido, afinal teria apenas o quarteto original no palco, mas já que ele não está, não vejo algum outro motivo para ocultar um sujeito tão eficiente como Wakeman.

            Enfim, estranhezas à parte, prosseguiram simplesmente com “War Pigs”, iniciando com o som de sirene, onde o telão do centro mostrava imagens de sirenes. Quando chega no poderoso riff, os telões alternam entre filmagens dos integrantes e do público próximo da grade. Posteriormente, imagens de explosões em guerras seriam exibidas, contextualizando a letra de protesto. Em certo momento, foi possível perceber que Ozzy deu uma longa desafinada, nada que tenha diminuído a emoção, ou mesmo o momento antológico de presenciar ele cantando os “oh lord yeah!”, acompanhado por Iommi e Geezer.

            Voltando ao primeiro álbum, executaram “Behind the Wall of Sleep”, sendo muito interessante sacar o característico andamento desse som ao vivo. E caramba, essa é uma parede de pancadaria sonora. O telão do centro alternou entre filmagens do grupo e uma animação exibindo vários olhos. Seguindo a ordem do debut, sem nenhuma pausa, Geezer inicia a fantástica intro no seu baixo, cheio de efeitos com pedais, anunciando “N.I.B.”, extremamente bem recebida, mais uma pancada sonora que deve ter emocionado muito dos presentes.

            O que veio na sequência foi o início da instrumental “Rat Salad”, que serviu para os integrantes de mais idade deixarem o palco, enquanto Clufetos comandava um espetáculo próprio, um solo de bateria que durou aproximadamente dez minutos, onde demonstrou domínio e precisão com o instrumento, e até que agitou o público. É aquilo, para quem gosta não tem errada, ver um músico desse nível executando um número desses é diversão garantida. Já para quem não é tão chegado em solos, a duração pode ter o deixado cansativo. De qualquer forma, presenciou-se alguns dos motivos que levaram ele a ser o baterista na fase final do Sabbath, “espancando” seu instrumento com vontade, inclusive fazendo uso de bumbo duplo.

            Sem pausa para Clufetos, este marca o ritmo de “Iron Man”, com um Ozzy bem humorado, alterando o verso do começo para “I am rusty man”. Obviamente, o público não perdeu a oportunidade de cantar os “oh oh oh” por cima do marcante riff. Esse foi outro momento onde ficou perceptível mais algumas desafinadas de Ozzy, e possivelmente onde ocorreu algum problema técnico com o microfone que ele estava usando, pois apesar de não ter falhado ou algo assim, no meio da execução um roadie vai correndo em sua direção e entrega outro microfone. Antes do solo final, Ozzy brincaria, apontando para Iommi e dizendo, “he is the iron man”.

            Ainda durante o solo final de “Iron Man”, Ozzy protagonizou o “momento traumatizador” da noite: sabe-se lá o porquê, ele resolveu baixar as calças por alguns segundos, mostrando a bunda para a galera. O mais engraçado foi ver que Iommi estava solando e não viu a cena, só que no momento que o público gritou, ele rapidamente olha para o Ozzy e o enxerga “apertando o cinto”, soltando uma risada.

            Se aproximando do final, veio a soturna “Dirty Women”, pessoalmente, outro momento grandioso, numa bela execução, composta por ótimas passagens instrumentais. Curioso que Iommi utilizou uma guitarra que estava desbotada, aparentemente por tempo de uso. Vale ressaltar que “Dirty Women”, junto de “Snowblind”, foram as únicas músicas apresentadas que não estão nos três primeiros discos do grupo. Nessa, começaria uma garoa bem fina, como havia ocorrido algumas vezes durante a tarde. Felizmente não houve chuva forte, foram poucas as pessoas que se preveniram colocando capa de chuva.

            Chegando aos finalmente, Ozzy falou, em inglês, que iriam tocar a última música, mas se a plateia agitasse fariam mais uma, e continuou, dizendo que a próxima se chama “Children of the Grave”. Eis que Iommi a inicia com a intro “Embryo”, igual o registrado no “Master of Reality”. Uma performance catártica, com Geezer “descendo a mão” em seu baixo. Ozzy não poupou sorrisos e “saltinhos” (e até um salto maior), em meio a animações de caveiras no telão do centro.

            Se retiraram do palco, para rapidamente voltarem com o “final do fim”, “Paranoid”, iniciando com Iommi fazendo uma intro a mais. Nesse momento restava acompanhar os movimentos finais dos músicos, ver Ozzy dando suas últimas corridas e pedindo para a plateia levantar as mãos. Eis que acabava, dessa vez em definitivo, após quase uma hora e quarenta de apresentação. Um misto de emoções ver essas lendas se despedindo, com os telões mostrando o nome do grupo seguida da frase “The End”, no som ambiente rolando a melancólica “Zeitgeist”.

            Era isso, quem compareceu presenciou uma aula de som pesado, ministrada pelos principais criadores de muitos dos pilares do estilo, que permanecerão por aí mesmo depois do fim das atividades como grupo. E por mais que, principalmente Ozzy, tenha dado um “escorregão” ou outro ali, este sem dúvida é um dos grandes frontman da música, e vê-lo em ação sempre terá seu valor, ainda mais levando em conta que ele está com recém-completados 68 anos. Além de que, o carisma dele é contagiante, vê-lo agitando com seus “saltinhos”, batendo palmas, fazendo o sinal de paz e amor, e repetindo quase a exaustão suas clássicas frases “I love you all” e “God bless you” certamente é uma grande experiência, e se levado em conta que ele estava acompanhado por outros dois “senhores” tão fundamentais na história da música pesada, e claro, outros dois músicos competentes, torna quase que uma experiência essencial, para quem gosta e quer entender o que é rock pesado, ou heavy metal, como achar melhor.

            Como ponto “meio negativo”, fica a qualidade de som, que apesar de estar tudo definitivamente bem audível, estava um tanto baixo, não tanto quanto no show do Rival Sons, e também não atrapalhando na maior parte, mas em alguns momentos os gritos do público estavam praticamente sobrepondo o que vinha do palco, e visto quem estava tocando, acaba sendo um tanto estranho assistir uma apresentação deles com um som mais discreto, por assim dizer.

 

Setlists

RIVAL SONS

Electric Man

Secret

Pressure and Time

Open My Eyes

Fade Out

Torture

Keep On Swinging

 

BLACK SABBATH

Black Sabbath

Fairies Wear Boots

After Forever

Into the Void

Snowblind

War Pigs

Behind the Wall of Sleep

N.I.B.

Rat Salad / Tommy Clufetos Solo

Iron Man

Dirty Women

Children of the Grave

Paranoid

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